quarta-feira, 22 de junho de 2016

O infinito da alma na paisagem

 Ave alcíone
Desenho gráfico, Rita De Blasiis 

No dia 06 de junho de 2015, escrevi este poema em prosa:

então a criatura se levanta e te diz quem você deve ser o que deve fazer o que precisa querer e o que você está fazendo aqui neste mundo e você surpreendido por esse ser que não te é nem te escuta nem te sabe nem te ama, ouve ouve ouve houve houve um tempo dois tempos tanto tempo que a palavra dor se abre em flor e o que resta é o riso do amor porque você não se levanta e não diz:

pinta a paisagem na alma apenas e alguns amigos e amigas no silencio próprio das aves 
fitam o infinito da alma na paisagem e abrem as próprias asas rumo aos longes todos da vida,
serenos do horizonte
atrás do horizonte





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Hoje, dia 06 de junho de 2016, após o Golpe,
compreendo do que estava falando...



O primeiro ataque frontal foi dirigido à Cultura...
Uma obviedade, a arma mais perigosa: aquela que elucida, coloca a consciência das pessoas em outro patamar, abre perspectivas novas, lança seus desafios, questiona o que é obsoleto...

O artista, para ser bom, precisa fazer uma leitura delicada, incisiva, arguta mesmo, do seu tempo. Para dialogar com ele, propor algo, ter realmente uma oferta generosa e significativa a compartilhar com os seus parceiros de jornada existencial...

Estamos vivos e queremos vida em plenitude. A existência programada por outrem não nos interessa: nós decidimos para onde vamos, o que desejamos fazer. Como seremos o que aspiramos ser...

No mundo da Arte, no universo da Cultura, liberdade é essencial porque criação é um exercício do livre pensar sobre o tempo/espaço aberto do mundo.

Surrupiar a autonomia do artista, inviabilizar a vida cultural de um povo é um ato de violência certeiro, ciente do seu objetivo mesquinho.

Não nos esqueceremos disso, antes, nos reuniremos, fortes e serenos sob a bandeira da liberdade que temos de optar pela resistência.

O artista, seja ele um ator ou um literato, uma bailarina ou uma artista plástico, antecipa o futuro, vislumbra possibilidades, lança luz sobre a sombra, encontra caminhos onde não se vê passagem...

Precisamos de Arte para nutrir o nosso espírito, necessitamos desse alimento que aprimora nosso sentir, que nos confere alegria de viver, prazer de elaborar e de fruir a produção artística...

Por outro lado, o artista precisa externar sua riqueza interior, dividir com o público o que gesta em seu espírito, compartilhar o seu trabalho... Viver dignamente do que pode e deve fazer...

A negação da função, da relevância desse processo é absurda em muitos aspectos e sua desumanidade pode ser sintetizada mediante a citação de uma realidade inegável: é entre humanos que o homem constrói a própria humanidade.

Onde não há Arte, nem Cultura, não se respeita a dignidade do ser humano. Grassa a violência.

Se a matéria prima da Educação é a Cultura, como afirma o antropólogo Tião Rocha, o segundo passo, o alvo imediato a ser atingido por esse governo temerário é a Educação.

Surrupiar dos educadores a liberdade de pensar, de questionar, de produzir conhecimento, impedir a leitura do mundo, da realidade é essa a intenção? Com qual finalidade?

Não somos massa de manobra, a reação dos educadores haverá de se integrar ao contexto de resistência do povo brasileiro.

Cada professor tem um compromisso consigo mesmo, com cada aluno e sua família, com a sua comunidade escolar, com o futuro do Brasil. Se o artista desempenha um papel de educador social que convida à reflexão o seu público, mediante o seu trabalho, o professor também atua nesse sentido, exerce o seu ofício como uma arte, por meio da qual promove o desenvolvimento do seu público-alvo também.

O espaço e o tempo onde se exercem essas artes são distintos, mas, são momentos e lugares, sim, onde as pessoas aprendem a viver bem e a conviver melhor. Educação e Cultura se complementam, uma não pode prescindir da outra. Nesse momento histórico tenebroso que vivemos, de absurdidades e de incertezas, a união dessas forças é urgente e necessária. Para que se faça luz sobre o caminho a seguir, a partir da decisão coletiva de lutar pelos nossos direitos humanos e sociais. Os Direitos inalienáveis de todos e todas nós. Artistas e público. Educadores e educandos. Brasileiros e brasileiras em nosso país, em uma sociedade livre, justa e solidária.

Rita De Blasiis
Uberaba, 02 de junho de 2016. 

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